Mariely Biff se tornou uma grande referência em sucessão familiar no agro, por discutir o tema em várias mídias, destacando a importância de se fazer uma sucessão adequada para que os valores e patrimônios familiares sejam preservados e lembrar o papel das cooperativas nesse processo.

A sucessão familiar no agronegócio é um tema de grande relevância, e envolve a transferência de um patrimônio – não apenas financeiro – construído ao longo de gerações, além de conhecimento e tradição. É um processo complexo que exige planejamento, comunicação e, muitas vezes, apoio profissional. E as cooperativas, tem se empenhado em seres grandes parceiras desse processo.

Em entrevista à MundoCoop, Mariely Biff traz um pouco de sua experiência com o tema e ainda, destaca os pontos de atenção no processo de sucessão, que deve – segundo ela – começar cedo com os pequenos, garantindo a próxima geração nos negócios da família.

Confira!

Como você se tornou uma referência em sucessão familiar no agro?

Como nasci em uma família de produtores, o amor pelo agronegócio sempre foi muito latente durante a minha trajetória. Atuo atendendo produtores rurais em todo o processo de profissionalização, sucessão e governança. Temos um escritório, do qual sou fundadora e diretora, que possui em sua estrutura a parceria de diversos profissionais renomados do nosso setor, que atuam em áreas como planejamento tributário, gestão econômica e financeira, psicologia familiar, organização patrimonial, questões ambientais e agrárias e planejamento contábil.

De que forma você analisa esse processo? Quais são os principais desafios?

Tenho mais de 19 anos de experiência no agronegócio e 13 anos atendendo famílias do setor. É um tema que precisa ser ainda difundido em muitas famílias, pois o conceito de sucessão ainda está muito atrelado à morte e substituição, ferindo o sentimento de utilidade e poder do fundador.

Existem diversos fatores que dificultam o processo, mas os principais são os conflitos familiares, de geração, a falta de planejamento, de preparo para a inserção da nova geração, de profissionalização do negócio familiar, incluindo regras, acordos e indicadores, que colaborem para uma tomada de decisão cada vez mais assertiva.

De que forma as famílias devem tratar o tema da sucessão familiar? Quais os caminhos para adentrar esse tema com sucesso?

A sucessão é uma preocupação da maioria dos negócios familiares. Porém, muitas vezes nenhuma ação é realizada e o processo deixa de ser iniciado no momento necessário. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), afirmam que 90% das empresas no Brasil são familiares, mas um percentual muito pequeno chega à terceira geração (menos de 10%).

Algumas dicas para lidar ou mitigar riscos de conflitos é estabelecer regras no negócio antes que sejam necessárias, estruturar com calma o processo de implantação da governança evita que muitos conflitos possam vir a existir. Quando não precisamos impor regras, é muito mais fácil ter a adesão da família e de toda a equipe. 

Como funciona o seu negócio? Como deve ser a conduta da família dentro dele? Como são realizadas a contratação, remuneração, desligamento de familiares? Para todas estas perguntas, temos o Protocolo Familiar, um instrumento celebrado entre os membros da família e colabora para reforçar o legado, valores e para nortear o processo de sucessão.

É fundamental entender e definir o papel de cada um nas três esferas que compõem a sucessão. Isso inclui, organizar pessoas, responsabilidades e direitos é algo que colabora muito com a profissionalização do negócio. Se cada um entender o seu lugar, mesmo que ele se sobreponha nas esferas da família, propriedade e gestão, é muito mais fácil o processo de tomada de decisão e para a realização de todos os alinhamentos de expectativas.

É necessário, capacitar os membros da família e do negócio, esse processo deve ser constante. Entender o negócio, os números e os resultados é uma obrigação de todos os envolvidos. Para isso, realize uma reunião de prestação de contas, reforçando um dos pilares da governança, que é a transparência. O amadurecimento da família e a profissionalização da gestão são primordiais para a continuidade. Principalmente quando a empresa já estiver na transição das gerações de sociedade de irmãos e consórcio de primos, onde a governança se torna uma questão de sobrevivência para o negócio.

Defina o processo de tomada de decisão, estabelecendo quem serão os responsáveis pelas decisões da empresa, quais as alçadas ou se tiver um comitê/conselho gestor, o percentual de votos de cada membro. Mantenha uma estrutura hierárquica compatível com o negócio.

O que deve ser levado em conta no processo de sucessão familiar no agro?

Os aspectos emocionais, traumas, mágoas, conflitos não resolvidos. Todas estas questões possuem a capacidade de destruir qualquer estrutura de negócio. Por isso, é essencial procurar profissionais que vivem o assunto na prática, que atendam as demandas não apenas nas questões técnicas, mas que olhem para o sistema familiar e a empresa com cuidado e profundidade. O objetivo é desemaranhar tudo o que não contribui para a harmonia, o crescimento e a prosperidade.

O processo deve ser iniciado quando os filhos ainda são pequenos, envolvendo-os em atividades, ensinando e os tornando pertencidos ao negócio. Além disso, a implantação de regras e a profissionalização devem acontecer para prevenir conflitos e melhorar a gestão. Precisa conversar, alinhar expectativas, buscar profissionais para orientar e capacitar tecnicamente, antes das tomadas de decisão mais complexas. Esse é um fator a ser considerado, e que colabora muito nas articulações do processo.

Qual é a importância de uma sucessão feita de forma adequada para que os valores e patrimônio da família sejam preservados? 

Um processo feito com qualidade e responsabilidade permite a perpetuação dos valores familiares, a unidade de família, o negócio e a prosperidade. Um processo malconduzido é capaz de dissipar o patrimônio e criar conflitos crônicos na família, além do gasto de energia emocional e de dinheiro tentando corrigir o que muitas vezes é irrecuperável.

Como as cooperativas têm auxiliado neste processo? Que papel elas desempenham para alavancar a sucessão familiar?

O trabalho das cooperativas com projetos voltados ao tema é essencial para a permanência das novas gerações nos negócios familiares, possibilitando a sua perpetuação. E este senso de pertencimento, de partilha e de cooperação que é proporcionado pelas cooperativas aos seus cooperados, permite alcançar muitas famílias e tocá-las para que visualizem quão valoroso é um processo realizado da maneira correta.

É de extrema necessidade capacitar as famílias para o processo, trazendo uma visão clara dos próximos passos, colocando todos na mesma página para que possam decidir de forma madura sobre o futuro.


Por Priscila de Paula – Redação MundoCoop