O Brasil desempenha um papel crucial no Conselho Mundial das Cooperativas de Crédito (WOCCU). A entidade tem defendido os interesses de mais de 400 milhões de cooperados em todo o mundo. E o Brasil, tem sido um defensor ferrenho do cooperativismo, atuando em diversas frentes, seja no apoio a causa necessários, impacto nas comunidades e manutenção dos direitos legislativos do sistema.

Além da defesa dos interesses dos associados, o Brasil tem sido um agente ativo na formação de futuras lideranças, promovendo a diversidade e a inclusão. O país tem se engajado em temas globais como as mudanças climáticas, as desigualdades e os refugiados, alinhando-se aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU. A participação brasileira em eventos como o G20 e as COPs tem sido fundamental para influenciar as políticas globais em relação ao cooperativismo de crédito.

Manfred Alfonso Dasenbrock, presidente da Central Sicredi PR/SP/RJ, conhece bem o papel do Brasil na agenda global do cooperativismo. Dasenbrock foi reeleito recentemente como Diretor do Woccu, sendo o único representante brasileiro no conselho. A votação e a posse ocorreram em Boston, EUA, como parte da Conferência Mundial das Cooperativas de Crédito (WCUC – World Credit Union Conference), promovida pelo WOCCU, e o novo mandato se estende até 2027. Desde 2009, ele representa o Brasil como diretor na entidade.

Em uma entrevista exclusiva, ele compartilha como tem sido seu papel dentro da Woccu, destaca os temas em pauta da entidade e ainda, destaca como o Brasil desempenha um papel fundamental no desenvolvimento do cooperativismo mundial.

Confira!

1- Na prática, qual o papel do Conselho Mundial das Cooperativas de Crédito (WOCCU)? Como ele tem sido importante para os maiores avanços do cooperativismo financeiro internacional?

Na minha visão, o principal papel do Conselho Mundial é defender os interesses dos mais de 400 milhões de associados ao redor do mundo nos países que integram o WOCCU. Essa defesa ocorre especialmente no Comitê da Basileia, onde se estabelecem as regulamentações do nosso movimento. A legislação, ou advocacy, como chamamos, é um dos pontos fundamentais dessa defesa. O WOCCU atua no parlamento europeu, que tem grande influência, e junto aos Bancos Centrais, especialmente o Federal Reserve dos Estados Unidos e o Banco Central Europeu. 

Outro papel crucial do WOCCU é a sensibilização e formação de futuras lideranças, incluindo o desenvolvimento de jovens líderes através do World Council Young Credit Union Professionals (WYCUP), traduzido para nós como Comitê Jovem. A diversidade e a inclusão são temas recorrentes defendidos pelo Conselho, alinhados com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU. Questões como desigualdades, guerras, migração, refugiados e catástrofes climáticas estão no radar do WOCCU, que busca contribuir e colaborar da melhor forma possível.

As mudanças climáticas são mais um tema em voga no Conselho e o caso das enchentes aqui no Rio Grande do Sul é um exemplo muito claro. Não é só dar apoio naquilo que é possível, mas sensibilizar lideranças em prol da solidariedade e isso é algo muito próprio. Nesse contexto das mudanças climáticas, o Conselho também desempenha um papel importante, influenciando e representando as cooperativas de crédito nos Fóruns do G20 e nas COPs, como a que será realizada aqui no Brasil, no próximo ano. Então tem papéis muito relevantes, que são explorados e, na medida possível, são compartilhados e tratados entre diferentes regiões conforme suas necessidades e desafios específicos. 

2- Quais as principais metas e objetivos do Comitê que foi eleito até 2027? 

O objetivo principal do conselho eleito, que inclui alguns membros reeleitos e novos membros, é ampliar o número de membros associados, fortalecendo a representação do comitê. Além disso, a tecnologia e inovação são prioridades, buscando atrair novos membros, especialmente jovens e adeptos à tecnologia, e compartilhar boas práticas como fizemos nessa conferência em Boston.

A atenção aos refugiados e imigrantes é um ponto importante, com a criação de um comitê permanente para tratar dessas questões. Assim como a declaração de gênero, que é outro tema relevante, que será debatido intensamente, especialmente em 2025, o Ano Internacional das Cooperativas, declarado pela ONU. 

A nossa meta principal é evitar retrocessos regulatórios e melhorar as condições do modelo de organização, com destaque para o mérito da Frente Parlamentar do Cooperativismo no Brasil, organizada pela OCB, e a liderança do deputado Arnaldo Jardim, presidente da Frencoop, que recebeu distinção especial pela defesa e construção de um ambiente regulatório melhor. 

3- Desde 2009, o senhor representa o Brasil como Diretor do WOCCU. Como você enxerga o potencial do cooperativismo nacional perante o movimento global?

O Sicredi integra o movimento do Conselho Mundial há aproximadamente 20 anos e, há 15 anos, tem uma cadeira no Conselho. Enxergo o potencial do cooperativismo nacional dentro do movimento global com muita propriedade, pois ele tem evoluído significativamente. Tem se fortalecido em termos de estrutura patrimonial, governança e práticas ESG. Portanto, temos um potencial muito grande, pois contamos com um ambiente regulatório favorável. 

Tenho ressaltado isso ao redor do mundo, temos um arcabouço regulatório robusto, construído coletivamente. Essa clareza sobre a aplicabilidade das normas e a defesa dos avanços, como a criação do nosso Fundo Garantidor e as resoluções do Banco Central do Brasil relacionadas à segregação de responsabilidades, evidencia o grande potencial que temos e o exemplo que somos para os demais países. 

Estamos presentes em quase 50% dos municípios brasileiros com estruturas cooperativas e muito próximos de termos associados em todos os municípios através de outros mecanismos. Nosso posicionamento é de estar presente, próximo e ao alcance dos associados. Vejo como um grande desafio, mas que gera um impacto positivo nas comunidades. Quando você se posiciona como uma organização social preocupada com iniciativas de educação financeira e inclusão é um desafio, mas temos um grande potencial a explorar. A formação de novas lideranças, aqui falando em jovens e mulheres associadas, fortalecemos a governança e construímos confiança.

4 – A partir da sua experiência nesta posição, quais as maiores oportunidades das cooperativas de crédito brasileiras no mercado financeiro? Ainda, quais os grandes desafios a serem superados nos próximos anos?

Uma grande oportunidade que vejo é a possibilidade de as cooperativas consolidarem o seu modelo de negócio, trabalhando sempre na defesa do cooperativismo, preservando a essência e o propósito junto às comunidades, realmente sendo cooperativas, conforme os ideais de Friedrich Wilhelm Raiffeisen e do padre Theodor Amstad. Trabalhar dentro do espírito original das cooperativas permite não se distanciar dos valores fundadores. Outra oportunidade significativa é a ampliação da intercooperação com outros ramos, como o ramo agroindustrial, saúde, transporte e educação, por exemplo. A intercooperação entre os sete ramos, incluindo o crédito, representa um grande potencial, apesar dos desafios, mas é benéfica para as comunidades e organizações. 

Os grandes desafios incluem a profissionalização das cooperativas. É essencial desenvolver pessoas para o mercado cooperativo a partir dos valores que defendemos, retendo e atraindo novos talentos. Então, o processo de retenção, fazer com que as pessoas se apaixonem, gostem da cooperativa de crédito, gostem do Sicredi, é um grande desafio que precisa ser superado constantemente.

Temos um desafio de trabalhar a paixão pelas causas que defendemos, como a igualdade de gênero, o desenvolvimento de lideranças femininas e jovens, a cooperação, a educação financeira, a sustentabilidade e o desenvolvimento de futuras gerações. Esses desafios exigem conscientização e dedicação contínuas para sermos bem-sucedidos e realizarmos o potencial pleno das cooperativas de crédito no mercado financeiro brasileiro. 

5 – Quais pautas deverão ser prioridades das cooperativas financeiras na atualidade? E os compromissos daqui para frente? 

Algumas pautas que considero prioritárias incluem, primeiramente, a reafirmação da essência cooperativa. É fundamental manter esse debate constante, sobre não ser mercado, não ser banco, ser cooperativa. As pautas regulatórias e normativas são vitais, assim como aquelas relacionadas ao desenvolvimento de pessoas, tanto colaboradores quanto novas lideranças de associados. 

Além disso, a pauta tecnológica é crucial, envolvendo inteligência artificial e outros mecanismos que atendam nossos associados e proporcionem um ambiente moderno e atualizado para nossos colaboradores, permitindo que desenvolvam suas carreiras e realizem seus sonhos. 

A questão climática será mais uma pauta recorrente devido aos desastres naturais e às mudanças extremas de temperatura, chuva e tempestades. Esses temas estarão próximos das cooperativas e das agendas globais relacionadas ao clima. A inclusão e a educação financeira continuarão sendo temas centrais, pois fazem parte do nosso núcleo, de nossos valores e da nossa identidade. Essas pautas se transformam em compromissos, que se interligam e são fundamentais para a nossa lógica de atuação. 

6- Qual a importância de reforçar a representatividade brasileira perante o movimento internacional? Como isso impacta o futuro das cooperativas de crédito?

Temos feito um esforço significativo junto ao Conselho Mundial para fortalecer nossa representação, destacando nosso crescimento em associados, ativos e presença. Trabalhamos internamente para que outras confederações brasileiras participem do movimento, somando forças. Quando os observadores externos percebem que estamos organizados no movimento da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), no Conselho Especializado de Crédito (CECO) e buscando convênios com o Banco Central do Brasil, isso nos torna mais fortes. 

Nos últimos 12 anos, conseguimos homenagear no ambiente da Conferência Mundial das Cooperativas de Crédito promovida pelo Woccu três cidadãos brasileiros notáveis no cenário nacional e internacional do cooperativismo. Em 2014, Roberto Rodrigues, ex-presidente da OCB e ministro, foi reconhecido em Denver, Colorado, por sua autoridade no crédito. Em 2018, o Conselho Mundial, em um grande evento nas Bahamas, reconheceu Márcio Lopes de Freitas, presidente da OCB, com uma distinção especial. Recentemente, no evento em Boston, o Conselho Mundial reconheceu o deputado Arnaldo Jardim, presidente da Frencoop. 

Mostrar essas conquistas para o mundo é fundamental, pois fortalece nossa posição e sublinha a relevância das cooperativas de crédito brasileiras no contexto internacional. Embora exija esforço, essa representação é extremamente valiosa e impacta positivamente o futuro das cooperativas de crédito, promovendo seu desenvolvimento e reconhecimento global. 


Por Redação MundoCoop